Quanto vale a arte? Qual o valor da poesia em nossa sociedade? São questionamentos levantados nesta narrativa distópica construída por Afonso Cruz. Vamos comprar um poeta?, é uma obra curtinha – daquelas que a gente lê em uma sentada – , mas cheia de reflexões bem atuais, que exploram a importância da arte e da poesia na vida humana, em tempos tão utilitaristas.

Na primeira página somos apresentados a uma menina – a nossa narradora – e sua família, de classe média, em um universo onde o materialismo predomina e se sobressai ante todas as outras coisas. Não há afetividade e todos vivem em prol da busca por dinheiro e prosperidade (soa bem familiar, não?). Isso fica bem perceptível na obra, inclusive pela escolha de cada palavra no texto:

“Dizem que é bom transarcionarmos afetos, liga as pessoas e gera uma espécie de lucro que, não sendo um lucro de qualidade, já que não é material e não é redutível a números ou dedutível nos impostos ou gerador de renda, há quem acredite – é uma questão de fé – , que pode trazer dividendos.”

A linguagem, como se pode ver, é uma atração à parte. A escrita, ainda que seja no português de Portugal, não gera desconforto. Muito pelo contrário, é um deleite para leitores mais atentos, apesar de em alguns momentos, soar um tanto complexa aos leitores iniciantes. Ainda assim, vale muito a experiência de contrastar dois portugueses bem diferentes. Além disso, as construções textuais, repletas de ironias, são divertidas, ao mesmo tempo que no chamam para a reflexão e importância da temática.

Em meio ao utilitarismo e materialismo, nossa narradora deseja ter um poeta. Nesse universo, artistas de uma maneira geral são comparados a animais de estimação, adquiridos em uma espécie de loja, etiquetados de acordo com suas principais características criativas. Após a compra, a menina (e sua família) passam a ter um contato diário com a poesia, situação que causa estranhamento, confusão, e uma alteração no convívio familiar.

Afonso Cruz utiliza essa narrativa para criticar a sociedade contemporânea, questionando o valor que atribuímos à arte, à cultura e à criatividade em um mundo cada vez mais voltado para o consumismo e a produtividade. Apesar de ser uma leitura leve e rápida, o livro provoca reflexões profundas sobre o papel da poesia e da arte em nossas vidas.

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